A fotografia como arte está morta ? de Wolfgang Hock 2010-11
Quando se fala dos começos da fotografia, todo mundo pensa normalmente logo no século XIX com suas invenções que parecem para nós hoje óbvios e na sua grande parte ultrapassados (p.ex. trem, luz elétrica, fonógrafo...). Mas para nossa surpresa existia a fotografia já muito tempo antes, mas em outra forma: O fenômeno da câmera obscura com sua imagem de luz projetada de cabeça para baixo e invertida que na verdade não é uma invenção, mas sim um fenômeno natural. Já na antiguidade no século IV antes de C., Aristóteles a descreva, mais tarde ela aparece de novo nos Árabes (Al Hazan) em 980. E agora uma coisa que coloca a historia da arte tradicional de cabeça para baixo e abala o nosso entendimento de arte: Desde do século XV artistas usaram na Europa do Sul e Norte tecnologia, em forma de aparelhos de apoio ótico, correspondendo ao nível técnico daquela época além da câmera obscura, lentes e espelhos, o que foi sempre ignorado ou até conscientemente deslocado pela história da arte tradicional, porque isto fere o ideal do gênio congênito do artista e certos mitos e tabus sobre a arte. Muitos artistas usaram estas lentes e espelhos (espelhos côncavos, convexos e aplanados) para criar projeções vivas e alguns deles usaram estas imagens projetadas mesmo diretamente para produzir desenhos e pinturas. Tão já muito tempo atrás esta nova forma de retratar o mundo – uma nova forma de ver – se espalho. Muitos historiadores da arte mencionarem somente que alguns pintores usaram a câmera obscura no seu trabalho, mas ninguém observou que lentes e espelhos foram usados de forma tão generalizada e cedo.(*) Por isso isto é para a maioria hoje – estudioso da arte ou não – ainda desconhecido, graças a postura esotérica da ciência da arte clássica que recusa radicalmente para a arte, qualquer uso de aparelhos e o procedimento das ciências aplicadas (a ótica, a química, a mecânica e hoje a eletrônica). Surpreendente é que uma filosofia inibitória desta, podia se manter até nos dias de hoje. O artista alemão Albrecht Dürer nos dá nos seus trabalhos de desenho exemplos comoventes das dificuldades que ele enfrentou na tentativa de afigurar objetos espaciais na superfície do quadro somente a olho. Aparelhos mecânicos dos italianos, de que Dürer desenvolveu seu aparelho de mira – uma rede de coordenadas em cima de um vidro – trouxeram alívio, mas também não mais, e Dürer não temia nenhuma viagem pelos Alpes nesta época muito perigosos para descobrir o segredo que, como ele acreditou com toda razão, os Italianos esconderam dele.
Exatamente neste tempo Leonardo da Vinci encomenda a construção de uma câmera obscura através da sua instrução, com a intenção de colocar ela a serviço da arte. Desde da antiguidade (os velhos gregos e romanos) o efeito da câmera obscura era conhecido, mas nunca foi colocada a serviço da arte. Somente na época da Renascença chegou a vez deste protótipo da câmera junto com outros aparelhos óticos como lentes e espelhos. A partir da segunda metade do século XVI estes protótipos da câmera ficam tão comuns nos ateliês dos artistas como o “manequim”, um boneco articulado, com que se estudava os movimentos do corpo. A imagem projetada da câmera obscura era nestes tempos excitantes, período em que a arte decidiu não andar mais com a teologia, mas sim com a ciência natural, um meio de prova de primeira categoria. Como Daniele Bárbaro de Veneza em 1568 no seu livro “La pratica della perspettiva”, no qual ele descreve a câmera obscura, dá a entender, nela se viu a prova prática da teoria: A câmera obscura permitiu a verificação da exatidão da construção matemática da perspectiva linear em frente da natureza, a certeza da verdade da concepção da ciência natural contra a mística-religiosa da idade media. Aqui formou-se pela primeira vez a crença da verdade, da objetividade da imagem da câmera que se mantía, na verdade tão fácil de contrariar, até o final do século XX, então quase ao dia de hoje, até a invenção e distribuição geral da imagem manipulada no computador. Dai pode se supor que a imagem da lente respectivamente espelho projetada se tornou a base para o descobrimento da perspectiva geométrica linear através de Leon Battista Alberti e Filippo Brunelleschi (que planejou e construiu a cúpula da catedral em Florença), mais um marcador de milhagem da Renascença. Muitos artistas experimentaram nesta época com projeções óticas, entre eles também Giorgione e Rafael, especialmente Caravaggio e seus seguidores; isto explica também o surgimento muito rápido e a difusão geral desta nova aparência do estilo naturalístico. Ao contrario Michelangelo fica no desenho em frente da natureza. Mas no norte Jan van Eyck e Hans Holbein trabalham com projeções de imagem, para citar só alguns. Nesta época, certamente não todos os artistas trabalharam diretamente com projeções de imagem, mas todos tentaram, cada um na sua medida e resultado diferente, imitar os efeitos naturalísticos de imagem, da forma como podia se ver em quadros baseados em imagens de lente. Isto era o novo “look” da época. Mesmo que demonstrado e usado por Leonardo da Vinci, mais tarde o uso da câmera obscura, câmera lúcida, lentes e espelhos foi na maioria das vezes ocultado. Espelhos e lentes eram nesta época muito raros e muito caros, um grande espelho plano custava quase o quíntuplo de um quadro do mesmo tamanho, então era disponível somente para poucos e pessoas muito ricas (na regra reis, aristocratas e claro a igreja). Veneza era um centro importante da produção e amolação. Os artesãos com suas leis da corporação precisavam permanecer a sua vida toda na ilha de Murano e não podiam sair da ilha sob ameaça da pena de morte (!). Também a igreja em Roma era muito preocupada para não deixar escapar estes segredos. Ela temia diminuição do poder dela. Se o povo soubesse tudo sobre o surgimento destes quadros, a crença no absoluto iria diminuir também, nisso seu poder estava estribada. Por isso sempre a ameaça de heresia pairava sobre isto tudo, os artistas excelentes eram os poucos confiados e receberam por isto grandes privilégios e riquezas materiais. Os ateliês dos grandes artistas eram nesta época comparável com os estúdios de filmes de Hollywood de hoje com seus inúmeros funcionários (do especialista até o simples ajudante) e produção em serie. O saber das máquinas óticas e lentes era muito limitado para poucos – um mundo muito pequeno –, e quem rompia com estes círculos, este esperava aquilo que aconteceu com Galileu Galilei mais tarde. A grande população foi deixada no escuro conscientemente, a maioria era de qualquer forma analfabeta (para esta época normal). Quem pertencia aos poucos que sabia ler, podia usar uma lente, de resto isto tudo era ‘coisa do diabo’. Se construiu já no século XVII máquinas, em quais através de espelhos internos apareceu a imagem projetada normalmente de cabeça para baixo já virada no vidro fosco, onde se podia traçar confortavelmente. Sempre mais artistas excelentes usaram nesta época as máquinas segredas, entre eles também Frans Hals, Velásquez, Jan Vermeer e Rembrandt.
É necessário neste contexto esclarecer bem que com isto tudo a arte dos artistas da época (ou de hoje) não está sendo diminuída ou alterada de jeito nenhum, mas vista sob outro aspecto: Ao contrário da velha concepção de manter secretas tais coisas insidiosas, o uso de aparelhos óticos não tem nada haver com “trapaça”, somente a mão artística pode fazer isto, e isto necessita grandes habilidades. É importante saber que imagens projetadas não criam desenhos, elas produzem apenas uma imagem em forma de uma visão, são ferramentas para medir. O artista é responsável com isto da mesma forma, e precisa de grandes habilidades para superar os problemas técnicos na tradução em pintura. Aparelhos óticos não facilitam o desenhar ou pintar, eles simplesmente ajudam o artista na imitação, na contrafação da realidade que na verdade não faz parte da arte (mimesis). Quem quer ver arte somente nisso, nunca a entenderá. E quem usa os aparelhos óticos somente para copiar, quer aturdir somente com habilidades artificiais, este precisa mesmo manter secreto o uso disso na arte, com o rabo do olho e com consciência pesada, como os inúmeros artistas acadêmicos do século XIX até hoje. A invenção da fotografia no século XIX aparece agora de repente numa luz muito diferente, porque aqui não se inventava a imagem da lente projetada, mas na verdade ‘somente’ a fixação química desta imagem da luz criada pela lente. Em 1839 a invenção da fotografia foi patenteado oficialmente pelo pintor (!) Daguerre em Paris. Com esta publicação o quindim sobre o segredo chegou ao seu fim, finalmente também a população ‘comum’ podia saber e participar disso aos poucos. Pela primeira vez foi possível criar e fixar um retrato da natureza que surgiu praticamente sem a mão humana, sem mão artística, somente através de processos físicos e químicos. Isto foi um choque ! E logo a questão da relação da nova técnica de imagem à arte plástica tradicional (pintura) estava no programa das discussões, parcialmente muito veementes. A batalha surgiu sobre a questão, se o aparelho fotográfico seria só um instrumento técnico que reproduz os fenômenos visíveis mecanicamente, ou se ele seria também um meio adequado de expressar sensações artísticas individuais. A briga sobre isto foi discutido em disputas pessoais, em artigos dos jornais, nos ateliês e até nos tribunais (!). Também a igreja se posicionou. Em um artigo do jornal de Leipzig (cidade grande na Alemanha) no “Leipziger Anzeiger” do ano 1839 pode-se ler o seguinte: “Querendo fixar imagens de espelho rápidas, isto não só é uma coisa de inviabilidade, como foi comprovado através de investigação alemã profunda, já somente o desejo disso é uma heresia. O homem foi criado através da imagem de Deus, e a imagem de Deus não pode ser fixado por nenhuma máquina humana. Deus de repente está ficando infiel a suas leis eternos e deixa acontecer que um francês em Paris coloca no mundo uma invenção altamente diabólica?” O pintor de história Delaroche chegou até este ponto que exclamou: “La peinture est morte!” (A pintura está morta) Porém Delacroix manifestou: “Como lamento que uma invenção maravilhosa como esta só apareceu tão tarde ... As fotografias são demonstrações concretas para o desenho através da natureza, de que nós só temos imaginações incompletas até agora.”(*)
A propósito Daguerre não foi o artista fracassado, como afigurado mais tarde freqüentemente pelos adversários da fotografia.Ele desistiu da sua profissão, como muitos outros pintores depois dele também, para dedicar-se a fotografia. Ele era, antes deste passo, muito bem-sucedido e famoso como pintor. Ele foi à fotografia, porque ele era um discípulo de um naturalismo objetivo, viu nela o meio mais perfeito. Para ele a fotografia era a perfeição da pintura naturalística.(*) Visto de hoje, a pintura dele é sem importância, mas suas fotografias (Daguerreótipos) entraram na história. Para nós hoje absolutamente inimaginável, para a maioria das pessoas da época, o fenômeno da fotografia foi uma experiência grande e misteriosa, já por estar em frente a uma máquina que pode criar em pouco tempo uma imagem do ambiente visível tão viva e verdadeira como a própria natureza. O poeta alemão Max Dauthendey escreve sobre o Daguerreótipo: “As pessoas tinham vergonha de olhar às primeiras imagens por muito tempo. Eles espantaram-se da nitidez dos retratos e acreditavam que os rostos pequenos e minúsculos das pessoas dos retratos podiam os ver, assim foi o efeito da nitidez e fidelidade à natureza desacostumada dos primeiros Daguerreótipos a cada um.”(*) Jornais ainda eram objetos de luxo raramente comprados, mais consultados em bares ou cafés, o processo fotográfico ainda não era ferramenta deles, a maioria das pessoas ainda nunca viram seu nome impresso (!). Ninguém menos do que Charles Baudelaire prognosticou coisas horríveis para a arte estabelecida por causa da fotografia com suas propriedades em 1859: “Quando se permite a fotografia completar a arte em algumas das suas funções, então esta em breve será estragada e deslocada. A fotografia precisa por causa disso voltar ao seu lugar original, ser servidora para as ciências e artes.”(*)
Hoje, 150 anos mais tarde, se reconhece o lado da arte fotográfica como também sua capacidade de servir à arte que não foi deslocada de jeito nenhum. Quando eu no fim dos anos 70 comecei a estudar artes plásticas na Alemanha ocidental, o uso de fotos para pintura ainda foi muito desaprovado, o traçado de projeções de slides ainda mais, mesmo que imagens de Pop Art e Hiper-realismo (Foto-realismo) já eram conhecidas nos círculos da arte. Em 1966 pinturas à óleo de Gerhard Richter, ainda não reconhecido nesta época, foram recusadas com a seguinte justificativa: “Nós não estamos interessados em fotos coloridas artificialmente.” Não se percebeu que não eram fotografias, mas pinturas à óleo feitas à mão.(*) Mas hoje parece que as imagens pintadas através de fotos e mesmo a maioria da “arte abstrata” estão reconhecidas, não somente em círculos da arte. Mas estas precisam ser pintadas com “tintas verdadeiras em telas reais”. Mas o uso do computador na arte ainda não. Como na época da invenção da fotografia química, os espíritos se dividem mais uma vez. Mas desta vez poderia se exclamar de forma contrária: porque desta vez os pintores não se sentem tão atacados, mas os fotógrafos sim. Uns recusam qualquer arte de computador porque a criação de imagem aparece pouco “feito à mão”. Outros não a recusam, mas a subestimam porque acham que estas imagens surgem de processos totalmente automatizados dentro do computador, desta forma qualquer um pode criá-las de forma rápida, fácil e barata. Mais uma vez a velha acusação aparece: Aí se pinta em cima de fotos. Mas com isto tudo não se percebe que exatamente a criação de imagens e o trabalho com elas no computador, está sujeita à inúmeras possibilidades de manipulação (manipulação = usar a mão), ao contrário da fotografia tradicional visto como feito à mão com filme de negativo e fotocópia positiva (só por causa da câmera escura e o odor de substancias químicas?). Este desenvolvimento, já começando primeiramente desde os anos 70 relativamente despercebido, afeta todos os tipos de imagem: Uma revolução está começando, afetando especialmente a fotografia.
Manipulação de computador significa que não é mais possível acreditar que uma fotografia represente um objeto específico em um lugar específico em um determinado tempo. E não é mais possível acreditar que a fotografia é objetiva e “verdadeira”. Este caráter específico da força da persuasão de autenticidade incondicional com aparentemente confiabilidade absoluta que a fotografia tinha na época, foi retirada dela definitivamente. Mas por que ? Poderia se deixar uma foto digital simplesmente crua e sem modificação, ai ela retrata simplesmente isto que estava na frente da câmera, com todos as falhas e erros, sem manipulação, como antes também ... Mas isto não é certo assim, pensado simples demais: Antes existia o negativo de que se copiava os ‘positivos’, as fotos, com pouca possibilidade de manipulação, porque o negativo (o original) era fixo e também as fotos eram manipulável de forma muito limitada somente na câmera escura. Daí podia se surgir a idéia de uma imagem da câmera objetiva sem nenhuma manipulação humana subjetiva. Diferente na fotografia digital: Aqui não existe mais um negativo fixo, mas ‘somente’ arquivos de imagem virtuais (agora os originais) que podem ser modificados de qualquer um e a qualquer tempo. Para isto não precisa se programas altamente complexos, mesmo com um programa deste tipo muito simples pode se remover objetos, mudar as cores de um objeto completamente etc., em qualquer tempo em qualquer lugar. A assim chamada objetividade está fora totalmente. Esta crença na veracidade, na objetividade da imagem da câmera que já estabeleceu-se na época da renascença no século XVI com a distribuição da câmera obscura e outros aparelhos óticos – não somente a partir do século XIX, como muitos acham – e nesta época ajudou a superar o ver e pensar da idade media, é hoje pela primeira vez fundamentalmente abalado por causa do surgimento da imagem manipulada no computador. Sem intenção a nova tecnologia coloca algo em questão que vigorava durante quase 500 anos, algo em que se queria acreditar, mesmo que nunca existiu. E como sempre durante mudanças incisivas, isto provoca grandes inseguranças e por isto comportamentos contraditórios, semelhantes aos tempos da invenção da fotografia química no século XIX. Ao contrário dos críticos que apontam a falta de mão de obra, a câmera volta à mão através do computador, volta pra lá, onde ela estava anteriormente, antes da invenção da fotografia química. O computador levou de novo mais perto a fotografia ao desenho à mão, e à pintura. O software usa termos como “paleta”, “pincel”, “caneta”, “borracha” etc. A imagem feito à mão mostra uma visão humana, e paradoxalmente o computador nos traz de volta a possibilidade de criar imagens humanas com uma máquina que não era possível desta forma antes com a fotografia química.
Como vai ser isto no futuro ? Uma nova visão está possível agora, com o computador ajudando a destruir a tirania da lente. A pintura na época da fotografia era influenciada em grande parte pela disputa de duas mídias se aproximando e afastando uma da outra, no qual a fotografia estava em vantagem. A pintura tinha a escolha de persistir ou de fugir. Desde o impressionismo (1870) ela rejeitou a imagem da projeção ótica, porque ela procurou mais verdade. No seguinte ela usou por isso também fontes fora da Europa que não conheciam a perspectiva (arte japonesa, escultura africana etc.). Ela retraiu-se em posições, para onde a fotografia não a podia seguir; a abstração era um tal refugio. Isto agora mudou radicalmente: A fotografia química acabou definitivamente, ela é o verdadeiro perdedor da historia, para ela mudou tudo. Quem imaginava isto alguns décadas antes que esta invenção irá perder sua importância completamente em ‘somente’ 160 anos ? Nós voltamos de novo ao ponto de partida, a mão está de volta, agora é a fotografia que precisa reagir, não mais a pintura. A imagem da lente projetada permanece. Tempos excitantes estão na nossa frente. Mas um olhar para trás na época da invenção da fotografia química mostra: Assim como na época a pintura, hoje a fotografia como arte não vai desaparecer, ela achará novos caminhos.
de Wolfgang Hock
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